Sozinha em casa... normalmente costumo gostar desta calma, é quando mais viajo através da imaginação... mas hoje não gosto. Porque hoje pela primeira vez, estou realmente sozinha. Mandei-o embora.
Eu já sou crescida. E posso fazer asneiras. Não tenho sempre que seguir o caminho da razão, estou farta. Estou farta que ele me diga o que fazer ou deixar de fazer. O que dizer. O mais correcto. O melhor para mim.
"Tens asas para voar, e não aproveitas. Recusas a herança que recebeste, preferes a lama aos céus. Começo a pensar que não mereces o tesouro que te foi oferecido..."
"Cala-te, vai-te embora. Eu não te quero mais comigo. Não preciso dos teus conselhos. VAI-TE EMBORA!"
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E assim ele foi. Com um último olhar triste oportunamente por mim ignorado, elevou-se em direcção ao céu... e eu não fui com ele. Pela primeira vez,deixei-o ir... Estou ocupada a cortar as minhas asas. Aliás, também estou farta de as tentar esconder. Assim resolvo o assunto de vez. Isto dói mais do que estava à espera, mas acaba por ser um alívio, a sério que sim. A partir de agora, tudo será melhor. As lágrimas... é só por causa da dor. Mais nada.
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Agora, sou adulta. Deixei para trás a minha infância. Trabalho. Tenho uma casa para sustentar, responsabilidades que ninguém mais no mundo pode assumir. Rio das crenças das crianças. Adormeço no metro, almoço algo desenchabido no C. Comercial. Tenho contas no banco e um cartão de crédito. Passo férias em sítios de meter inveja às minhas amigas. Graças a Deus, cresci e sou normal.
Mas às vezes... às vezes a minha imaginação é mais rápida que a minha censura... então a criança que há em mim volta a despertar, e eu vivo os mais belos sonhos acordada. Mas depois volto à realidade e olho tristemente para o sítio onde elas costumavam estar. E arrependo-me do que fiz... mas rapidamente finjo não me importar, e penso no que vou fazer para jantar nesse dia. Isso sim, é importante.